10 de setembro de 2019
Quem nunca ouviu falar do Mercado de pulgas? Não? Pois eles de fato existiam. Eram feiras ao ar livre para vender roupas, calçados, acessórios usados, que tinham esse nome pela pouca preocupação de quem vendia com a higiene e preservação das peças que geralmente eram vendida infestadas de pulgas.
O brechó como é chamado hoje, com lojas fixas, com produtos em bom estado e por um preço mais acessível, se popularizaram nos períodos pós-guerra, quando muitos países se encontravam em crise e as pessoas viam nos produtos usados, uma possibilidade de poupar gastos.
E esse nome, Brechó. Aparentemente não faz nenhum sentido. Um nome aleatório para caracterizar a venda de usados? Não, o nome foi inspirado na primeira loja dessa categoria no Brasil, que funcionava no Rio de Janeiro sob a direção de um homem chamado Belchior, por tanto, a loja de Belchior.
O termo passou a ser tão conhecido que aparece no conto “Ideias de Canário” de Machado de Assis, “… escapei saltando para dentro de uma loja de Belchior… a loja escura, atualhada das cousas velhas, tortas, rotas, enxovalhadas, enferrujadas que de ordinário se acham em tais casas, tudo naquela meia desordem própria do negócio”.
Com o passar dos anos, o nome ficou mais curto, são chamadas apenas de brechós. Já a qualidade dos produtos ficou maior. Atualmente os donos de brechós tem uma preocupação com as peças, como garante Alexia Katharina Herrschaft, dona de brechó, “porque a gente tem um cuidado, não vendemos roupa rasgada, suja, lavamos todas as peças que chegam e que a gente compra, tem todo um trabalho por trás”.
Brechós e bazares podem ser parecidos, mas não são a mesma coisa. Brechós são lojas fixas, ou onlines feitas visando lucro pessoal. Como se trata de comércio, assim como qualquer outro estabelecimento, o brechó precisar ser registrado e possuir alvará de funcionamento com pagamento de impostos e todas as burocracias. Já o bazar, geralmente visa arrecadar fundos para alguma causa beneficente, mas não é uma regra, podem ser realizados em praças, pavilhões de igrejas, feiras, ou até mesmo em casas ou garagens.
Mas nem sempre os brechós tinham esse conceito entre os brasileiros, “há algum tempo, aqui no Brasil, a gente só ouvia falar de brechó, que era aquele lugar para comprar roupa barata e quem gostava de coisa antiga e vintage, sempre frequentou, mas eram lugares mal vistos por muita gente” como conta a designer de moda Elys Maria Chagas, também proprietária de brechó.
Embora sejam peças usadas, são muitas as vantagens em fazer compras em brechós. A produção têxtil gera gastos de energia, água, uso de produtos químicos e muitos outros. O reaproveitamento de peças que ainda podem servir para alguém, gera um desenvolvimento sustentável. Até mesmo pessoas que não tem o costume de comprar roupas usadas afirmam isso, como é o caso do Daniel Marcondes, “eu nunca comprei roupas usadas, não por algum preconceito, mas eu acho mais prático comprar roupas novas em um site da internet, mas eu acho bem bacana a questão da sustentabilidade.”
A sustentabilidade é um dos grandes fatores que contribuem para a popularização dos brechós, como relata Bruna Shayane Oliveira, dona de um brechó online, “o brechó está ligado diretamente com a sustentabilidade, já que teoricamente os brechós são considerados os recicladores das roupas, pegam roupas que seriam descartadas e dá uma nova vida, uma nova chance, fora que evita que matéria prima seja utilizada novamente”. Isso se dá pelo fato de enquanto lojas convencionais ou de departamento produzem roupas em larga escala, os brechós reaproveitam roupas antigas que ainda podem ser usadas, sem a necessidade de produzir novas peças. A desvantagem da produção exagerada nos dias atuais, são os danos ao meio ambiente como diz Giovanna Dalla Lana Bertol, que trabalha com brechó há dois anos, a respeito das grandes lojas de roupas, “poluem muito e gastam milhões de litros de água para a produção das peças”.
Bazaar é uma expressão em inglês que se refere a vendas com desconto em épocas promocionais.
Não é somente o gasto de água que preocupam a respeito da saúde do meio ambiente como diz o biólogo Paulo Roberto Cittadella “Na produção de couro pronto para confecções utilizam-se metais pesados, que fatalmente vão parar nos rios. Na produção do algodão, utiliza-se pesticidas, defensivos agrícolas, combustível, sem contar que a degradação destes polímeros levam de.200 a 500 anos. Acho que a indústria da confecção ganha disparado da petroleira na produção de resíduos potencialmente danosos a saúde e ao meio em que vivemos”.
A internet tem um papel importante nessa nova moda, além de colaborar nas vendas, ela ajuda na conscientização dos consumidores com declara Isabelle Carolyne, que trabalha no ramo desde 2011, “As pessoas estão tomando consciência, a internet vem para isso, trazer mais informações, mostrar que se a gente não tomar algumas atitudes no nosso dia-a-dia, principalmente em relação ao nosso consumo, vestuário, eletrônicos, vamos acabar com nosso planeta”.
Existem outras formas de moda que ajudam na questão da sustentabilidade, que de certo modo estão ligadas a brechós, como o Upcycle, que consiste no reaproveitamento de tecidos para a confecção de novas peça de acordo com a designer Elys, “é você reaproveitar tecidos que já foram feitos, transformar uma calça jeans em um top, utilizar aquele tecido que já foi feito, que é um modelo que não vai mais ser usado, que a pessoa não vai utilizar mais e transformar aquilo em uma outra peça, utilizando o tecido que ia para o lixo”.
Geralmente o público mais engajado nas questões ambientais são os jovens, que são quem mais tem o costume de comprar em brechós como afirma Giovanna, “meu público é majoritariamente feminino e universitário, que são as pessoas mais engajadas na luta pelo meio ambiente e que tem acesso às postagens que nós tentamos divulgar.” e também Alexia, “o perfil principal dos meus clientes são jovens, estudantes. Como a gente tem um público muito grande nas redes sociais, quem geralmente usa essas redes é o jovem, eu tenho cliente a partir de 15 anos”, relatam as duas proprietárias de brechós na cidade de Cascavel.
Mas esse não é único aspecto que motiva esses jovens a comprarem em brechós. O estilo vintage, que consiste em roupas antigas, tem voltado a moda e faz sucesso entre os jovens. “As vendas no Instagram, a gente foca nesse estilo mais vintage, jaquetas antigas, jeans antigo mais pesado, roupas dos anos 80, 90 tem peças até dos anos 50” diz Alexia, e afirma a cliente Amanda Marcondes, “o que mais me atrai na hora de comprar em brechós, é que eu gosto de coisas vintage, e é em lugares assim que vai ter”.
A lojas convencionais ou de departamento, notaram a procura do público por peças nesse estilo, e tentam acompanhar a concorrência disponibilizando peças novas, com aparência de antigas, “tanto que você vai na vitrine dessas lojas e vê roupas que parecem ser dos anos 90, mas que são fabricação de agora” de acordo com Alexia.
A cliente Estéfani Cristina da Silveira enfatiza dois motivos que a inspiram a não comprar nessas lojas, “eu gosto mais de comprar em brechó, por uma questão mais de estilo do que de preço, o preço ajuda, mas é mais pelo estilo da roupa retrô, porque geralmente quando você vai numa loja no shopping, ou no centro, você não vai encontrar exatamente aquele tipo de roupa, sem contar que são peças únicas, dificilmente vai ter outra pessoa com a mesma roupa”.
O preço é outro atrativo para quem compra nos brechós. Mas será que isso afeta nas vendas das lojas de roupas novas? De acordo com o empresário João Pedro Bazanela, “o brechó é um comércio totalmente diferente, apesar de ser o mesmo foco que é a roupa. Nenhum comércio está livre de concorrência, talvez indireta, mas nada que afete as vendas”.
Os brechós que funcionam em locais físicos que são registrados como lojas, têm as mesmas obrigações que lojas de artigos novos perante a lei, “para a abertura de um brechó é necessário um contador devidamente habilitado no Conselho Regional de Contabilidade, para que realize os atos constitutivos, bem como informe ao empreendedor sobre a legislação tributária”, conta a Advogada Ana Caroline Lima Nascimento Kouth.
Mas existem os brechós online, que funcionam muito bem, de acordo com Bruna, “eu envio por correio ou entrego em mãos quando a pessoa é da cidade. É bem tranquilo e fácil”.
Nos brechós online, Ana diz que “para o comércio eletrônico, deverão ser observados outros aspectos, os quais regulamenta o Código de Defesa do Consumidor para dispor sobre a contratação desse tipo de comércio, isso quando a empresa possui um site.”
Essas questões se aplicam quando a pessoa tem uma empresa registrada como pessoa Jurídica. Quando é pessoa física, o que é muito comum pela internet, que são vendas feitas de pessoa para pessoa, sem uma empresa de fato, “não vou ter aplicabilidade do código do consumidor, a pessoa vai comprar confiando que meu produto é bom mesmo, ainda porque é brechó, coisas usadas”, garante a advogada.
A segurança, que o código do consumidor garante, afasta algumas pessoas dessa categoria de vendas que são os usados, já que em alguns casos, os brechós não registrados, principalmente os online, não fornecem de acordo com a lei. Mas não é o único motivo, como o caso de Danúbia Rocha que já comprou em brechós, mas não tem mais esse costume, “eu voltaria a comprar em brechó, mas prefiro as lojas convencionais, porque você encontra coisas que quer, dependendo da situação você já tem direcionada, marca, modelo e tamanho, que para mim que uso números um pouco maiores, é uma dificuldade encontrar.”
O “DESENCANTEI” é um dos brechós mais conhecidos de Cascavel. Ele começou em um grupo de Facebook que se chamava Bazar Feminino. A proprietária Isabelle Carolyne conta ter aberto o negócio por uma necessidade, “eu estava endividada, tinha muita coisa que eu tinha comprado compulsivamente e não usava. Então eu comecei a vender essas peças”. Em 2012 surgiu a ideia de organizar o primeiro bazar presencial para venda de roupas.
Com o passar dos anos, o negócio foi ganhando fama, e há um ano funciona em uma loja fixa com brechó, “aluguei sala, comecei devagarinho, agora eu tenho uma funcionária, a gente abre meio período” como afirma Isabelle.
Outro caso de cliente que não compra mais em brechós, é o caso da Maria Fernanda Tavares Teodoro, “ultimamente prefiro lojas convencionais, por serem mais fáceis de encontrar o que busco, pois brechós necessitam de paciência pra garimpar o que busca. Não compro mais pela falta de praticidade”.
Assim como existem pessoas que não curtem brechós, tem algumas como a Heloísa Vieira, “eu nunca comprei roupa num brechó, nunca fui, mas eu morro de curiosidade, porque eu conheço bastante gente que vai e são bem estilosas”, menciona a estudante de medicina.
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