O Mundo que Habito - As fantásticas gravuras de Lucie Schreiner

Muito se pode esperar da crescente produção de Lucie Schreiner. Cada uma de suas gravuras aborda uma dimensão do fascínio e oferece parâmetros próprios de fruição. Vistas em conjunto, são capazes de reter por horas o olhar. Nessas composições intrincadas, verdadeiros mundos em miniatura, componentes se entrelaçam, numa intensa simbiose. A elementos biomórficos se unem correntes, laços e engrenagens. Equipamentos eletrônicos e científicos concorrem para instaurar realidades paralelas, fundadas em leis próprias.

Lucie trabalha a partir de uma leitura pessoal da técnica da xilogravura. Em sua abordagem, a forma, comumente tratada em planos, adquire volume pelo emprego de diferentes linhas e texturas. O olhar atento logo percebe que as impressões também são desprovidas dos esperados veios de madeira. Isso ocorre porque a artista dispensa a matéria-prima natural e lança mão de placas de mdf, homogêneas, industrializadas. Desse modo, além das peculiaridades formais e temáticas, é acrescida uma nova camada, evolutiva, à tradição.

Seria errada qualquer objeção nostálgica a esse processo de fatura. Se o uso de placas de madeira evoluiu, historicamente, para chapas de cobre e corrosivos, o emprego de contraplacados e mdf, bem como de quaisquer materiais novos ou alternativos, existentes ou que se venham a inventar, deve ser tido como decorrência da prática do entalhe. A arte evolui nas formas tanto quanto pelos meios consecutivos e há mais de um século essa irrevogável liberdade de proposição foi conquistada pelos artistas.

Nas gravuras de Lucie, a estrutura despretensiosa induz o olhar ao universo dos detalhes. As dimensões e proporções dos elementos seguem uma lógica ditada pelo sentimento e empiria, muito mais do que por rigores geométricos ou correspondências com a realidade. Prevalecem o ritmo, a sequência, a apreensão das articulações em contínuo. À composição, por vezes estática, se contrapõe um movimentadíssimo campo de eventos internos. Figuras se repetem, mas nunca exatamente, mantendo a criação isenta da padronização e reafirmando a abundância assentada na heterogeneidade.

Não é por acaso que essas obras mantêm analogias com mundos. A arte, livre e descomprometida, bebe em fontes diversas, tirando proveito de paralelismos. E Lucie aborda, na atenção aos seres, máquinas, relevos e estruturas, preceitos análogos aos da Geografia, matéria de sua formação. É claro que não se trata aqui de etnografia, nem do inventário de propriedades naturais. Trata-se, em vez disso, de equivalências, que convergem pelo interesse pessoal da artista. Analogias apontam semelhanças entre processos, preservando as distintas naturezas dos objetos em comparação. Por isso, alusões diretas surgidas aqui e ali, os globos, termômetros, medidores e instrumentos científicos, servem para estabelecer contexto e parâmetros à fantasia. O resultado é, por isso, análogo ao mundo em que vivemos, onde se operam a fusão entre seres vivos e tecnologia e a multiplicação de pormenores hiperlativizados.

Da arte pura a pequenos ex-libris, Lucie Schreiner atende a propósitos vários com igual inventividade. O olho percorre as composições, descobrindo reminiscências minerais, tecnológicas e heráldicas, recontextualizadas sob o mesmo espírito criativo. A natureza é relida, seres tornam-se híbridos de mecanismos e a História é sincreticamente revisitada.

Em pouco tempo, a artista partiu de uma concepção narrativa e percorreu antigos referenciais da gravura para atingir uma exuberância que transcende o caráter descritivo. Suas composições iniciais, de temática singela e estruturadas em sobreposições, deram lugar à interação dimensional das formas. No percurso, composições passaram a se justificar cada vez mais por si, garantindo independência de associações textuais e culminando no atual desenvolvimento da artista, cujas bases técnicas e criativas estão consolidadas.

Texto de Roberto Ormond

https://robertoormond.blogspot.com/2019/02/xilogravuras-de-lucie-schreiner.html

O Mundo que Habito

Formada em Geografia, iniciou sua atividade artística em 2007, na Usina de Arte, Rio Branco, Acre no Curso Livre de Artes Plásticasl. Concluiu o curso em 2009 e deu sequência aos estudos de xilogravura de forma autodidata. No momento está cursando Arquitetura e Urbanismo.

Realizou diversas exposições individuais, entre elas, Caleidoscópio, Sonhos gravados no Ecomuseu da Itaipu em Foz do Iguaçu em 2015. Filhos da Terra na Galeria Juvenal Antunes em Rio Branco Acre em 2009 e na Mostra Cultural Mandala em Brasília no Centro de convenções Ulisses Guimarães em 2016, Sonhos e Máquinas Museu Casa da Xilogravura Campos do Jordão, São Paulo em 2017.

Participou de várias exposições coletiva, mostras, Salões e bienais, destacando-se a participação na 5ª Bienal Internacional de Santo André em 2010, na 3ª Bienal Internacional de Gravura Lívio Abramo, Araraquara São Paulo em 2014, na Biennale Internazionale di Opere di Carta – Palazzo Fogazzaro, Schio, Italia em 2015, na 3ª Bienal Internacional José Guadalupe Posada, México 2017, da exposição de comemoração de 30 anos da casa da Xilogravura, 2017, 14ª Bienal Internacional de Curitiba em 2019 e no momento esta participando do projeto the International Graphic Exchange Program  2020, The United Vibes, na Índia e foi selecionada para International Print Biennial Varna 2021, Bulgária. 

Obteve em sua carreira algumas premiações, como o prêmio de melhor gravura no Salão Hélio Mello em 2010, medalha de bronze na 1° Mostra Taubateana de gravura em 2011 e medalha de melhor gravura na 2ª Mostra Taubateana de gravura em 2013. Grande prêmio reencontro da Casa da Xilogravura 2017 e reconhecimento popular.  Recebeu o prêmio Prefeitura Municipal de Cascavel na 20ª Mostra Cascavelense de Artes Plásticas 2017. 

Tem obras na Pinacoteca Memorial Fundação Cristiano Varella Hospital do Câncer Muriaé, Minas Gerais, na Pinacoteca de Araraquara, São Paulo, no Laboratório das Artes, Franca, São Paulo, em Schio, Italia, no Museu Casa da Xilogravura Campos do Jordão, São Paulo e no Museu de Artes de Cascavel.

Ministrou várias oficinas de xilogravura destacando duas que foram na Unila – Universidade Federal da Integração Latino-Americana e na Unioeste, Universidade Estadual do Paraná.

Título: Serelepe
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões: 20x30cm
Ano:2020

Título: Corpos Côsmicos
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões: 60x84cm
Ano:2016

Título: Magnificência
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões: 60x84cm
Ano:2016

Título: Cyborg
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:60x84cm
Ano:2015

Título: Ovo Fabergé
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:17x21cm
Ano:2017

Título: Selfie
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:60x84cm
Ano:2017

Título: Genesis
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:60x84cm
Ano:2017

Título: Hermético
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:60x84cm
Ano:2016

Título: Alter Ego
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:60x84cm
Ano:2017

Título: Troglodytes Aedon 2
Artista: Lucie Schreiner
Técnica: Xilogravura
Dimensões:17x21cm
Ano:2020